A primeira onda de calor do ano na Europa levou os termômetros para mais de 40°C em diversas partes do sul do continente nesta segunda-feira (30). O maior registro já havia ocorrido no sábado (28) na Espanha, 46°C, e alertas de saúde e incêndios florestais foram emitidos também em Portugal, França, Itália e Grécia.
Na Alemanha, que proibiu de regas de jardim em residências a churrascos em parques públicos, a expectativa é de recorde de temperatura na quarta (2). A marca atual é 41,2°C, atingida em 2019.
Em Sevilha, para a quarta Conferência sobre Financiamento e Desenvolvimento da ONU, o secretário-geral da entidade, António Guterres, repetiu seu mantra do ano passado, quando a crise climática provocou o ano mais quente da história: “Ondas extremas de calor não são mais eventos raros. São o novo normal”.
O calor excepcional deixa especialmente vulneráveis idosos e crianças. Cidades italianas pediram que as pessoas evitem circular nas ruas entre 11h e 18h; mais de 200 escolas francesas suspenderam as aulas. “Nunca tivemos isso antes”, declarou a ministra de Meio Ambiente da França, Agnès Pannier-Runacher, sobre o fato de 84 dos 101 departamentos do país estarem em alerta laranja, o segundo mais alto do país.
Nesta terça (1°), Paris e outros 15 departamentos devem ser alçados ao alerta máximo, vermelho, repetindo a emergência verificada em agosto de 2023.
A França também registrou o primeiro incêndio florestal da temporada, 400 hectares consumidos em Bizanet, quase na fronteira com a Espanha. Fogo espontâneo ou provocado é preocupação também das autoridades na Alemanha, que experimenta uma temporada de seca e já ensaia restringir o consumo de água em algumas localidades.
A temperatura média de junho no país foi de 18,5°C, bem acima da média histórica. Segundo o DWD, o serviço de meteorologia alemão, o natural seria 15,4°C, a média registrada de 1961 a 1990. Os padrões atuais passam longe do natural e desafiam costumes e até mesmo os padrões construtivos do país.
Apesar de popularização recente, aparelhos de ar-condicionado ainda são itens raros em cidades como Berlim, em que a preocupação principal sempre foi o rigor do inverno. Jornais, sites e redes sociais trocam dicas de como administrar janelas, cortinas e persianas para aproveitar o que ainda resta de ar frio pela manhã e isolar os ambientes do calor e da luz no resto do dia.
No último fim de semana, 15 mortes por afogamento foram registradas no país, o maior número do ano até aqui. Além da imprudência, as autoridades apontam para a chance de colapso provocado pela diferença de temperatura entre o ambiente e a água, notadamente em lagos e rios.
Outra marca do fim de semana foi a temperatura do Mediterrâneo. Segundo medição do observatório Copernicus, da União Europeia, a superfície do mar que banha o sul do continente alcançou a média de 26,1°C, a maior já verificada em um mês de junho. O registro vem crescendo cerca de um grau por ano desde 2023, efeito direto da crise climática provocada pela queima de combustíveis fósseis, entre outros tipos de emissões.
De acordo com cientistas, oceanos absorvem cerca de 90% do calor gerado pelas atividades humanas. O papel regulador, porém, não dá conta do padrão de aquecimento atual. O mês de maio deste ano, também segundo o Copernicus, foi o segundo mais quente da história, perdendo apenas para o de 2024.
O calor também castigou as primeiras rodadas do Torneio de Wimbledon, em Londres. A temperatura no terceiro Grand Slam do ano chegou a 32°C nesta segunda (30).
“Hoje, o desenvolvimento e seu grande motor, a cooperação internacional, enfrentam ventos contrários extremamente fortes”, declarou Guterres no início da reunião de quatro dias na Andaluzia, intensamente afetada pela onda de calor.
“Vivemos em um mundo onde a confiança está se desintegrando e o multilateralismo está sob pressão. Um mundo com uma economia em desaceleração, tensões comerciais crescentes e orçamentos de ajuda dizimados. Um mundo abalado por desigualdades, caos climático e conflitos devastadores”, afirmou o secretário-geral.
Guterres sublinhava os efeitos do corte de mais de US$ 60 bilhões (R$ 298,4 bilhões) em programas globais de assistência promovido pelo governo Donald Trump desde sua posse, em janeiro, tema principal do evento. O apoio a países pobres no enfrentamento da crise do clima é uma das frentes mais prejudicadas.
Folha de S. Paulo