Leticia Albuquerque

Especialista em ler e em leis.

Instagram: @adv.leticia.albuquerque

Artesania

Maria foi artesã por dois ou três anos. Cadernos artesanais era a sua arte. Adorava escrever neles e também ver outras pessoas o usando para diversos fins. Tudo era feito no que ela chamava de quarto-escritório-ateliê e ela também tinha uma equipe formada por ela e pela senhorita Clarinha, uma senhorita de quatro patas, que fazia o controle final de qualidade dos cadernos e ficava madrugada a dentro com Maria até ficar tudo bem prontinho.

Um dia, senhorita Clarinha destruiu linhas de fio encerado. Maria questionou se seria acidente de trabalho ou demissão por justa causa. Decidiu pela primeira opção, afinal era sua companheira de trabalho.

Um caderno artesanal é feito em várias etapas, umas mais longas que outras, umas mais legais que outras, mas todas importantes para o resultado final. E assim também é a vida, não acham?

Primeiro surge a ideia, que é desenhada no primeiro papel que encontrar na bagunça do quarto-escritório-ateliê. Tenta desenhar os mínimos detalhes para o que se produz saia bem parecido com o planejado. Depois separa os materiais, lista o que está faltando. Se algo falta vai correndo para o centro comercial comprar o que precisa. Dessa vez, ela estava atrás de tecidos vintage e de “A noite estrelada” de Van Gogh, não teve êxito e por isso ficou desolada.

Lembrou do Primeiro Amor: “a gente tem que trabalhar com os recursos que tem” e do Segundo Amor “eu tomava café frio porque era a única opção.” Humm! Vamos deixá-los para trás!

Maria comprou várias estampas de borboletas. Ela não consegue imaginar um ser humano que não goste de borboletas, pois elas significam metamorfose, mudança, transformação. E cá para nós todo mundo precisa de recomeços de vez em quando. Ninguém precisa ser a mesma pessoa sempre. Mudar no sentido de evoluir é tão bom, Maria recomenda.

O segundo passo é cortar o papelão. Essa parte é a mais difícil. “Mas ninguém disse que seria fácil”. Todo mundo já ouviu essa frase em algum momento da vida. Agora é preciso de força e técnica. Maria explica para quem é destro: segura o papelão com a mão esquerda com muita força enquanto a mão direita com um bom estilete desliza na régua metálica sem tanta força até cortar o papelão, respeitando as marcações anteriormente feitas. A capa e contracapa devem estar iguais.

A terceira etapa é cortar o tecido de acordo com o tamanho da capa. Essa parte é bem gostosa de fazer e se o tecido estiver amassado ela dar uma engomadinha.

Agora o tecido é colado ao papelão. Dica: se o tecido for liso use pouca cola para não manchar. Se o tecido for estampado pode usar cola a vontade (sem exageros, claro), pode usar pincel ou aqueles rolinhos para espalhar bem a cola no papelão.

Papelão encapado, Maria vai para a quarta etapa. Dobrar papeis, formando o que se chama de miolo. Por exemplo, ela dobrou 10 papeis e formou um miolo. Depois com a ajuda de uma agulha especial ela faz furinhos na capa e nos miolos que é por onde passará a agulha com a linha encerada.

Na quinta etapa é hora da costura! Sim, papeis podem ser costurados para virarem um lindo caderno artesanal. Desta vez, ela vai fazer uma costura chamada copta, que foi inventada no Egito há mais de mil anos. Cá para nós os egípcios antigos só podem ter vindo de outro planeta de tão evoluídos que eram.

Na costura copta é simples: um miolo é costurado à contracapa, depois vai costurando miolo em cima de miolo, miolo em cima de miolo, no último miolo que tiver, costura-o na capa.

O processo é basicamente esse. Alguma etapa deve ter sido esquecida na descrição, mas Maria fazia tudinho com muito zelo e capricho. E se gabava mesmo do resultado que era finalizado com cheirinho de orquídea e embalagem personalizada com direito à cartinhas feitas a mão.

Maria deu nome a sua criação de Ycamiabas Cadernos Artesanais, uma referência às índias guerreiras da Amazônia e homenagem `a rede de apoio feminino que recebeu durante todo esse movimento e aventura. As Ycamiabas saiam do quarto-escritório-ateliê e viajaram para o a Brasil e fora do Brasil: Natal, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Brasília, EUA, Alemanha e claro para nossa linda cidade João Pessoa (era o ápice da pandemia, o comércio virtual estava bombando).

Todos perguntam à Maria porque ela não faz mais os cadernos. Ela responde igual a Toquinho: “a vida segue sempre em frente o que se há de fazer?”.

* Os textos e vídeos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião do Portal Paraíba Dia a Dia.

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