A taxa de pobreza caiu no Brasil pelo terceiro ano consecutivo em 2024, mas a inflação, especialmente a de alimentos, foi um grande empecilho para que o indicador recuasse com mais força — e a tendência é que a parcela de pobres na população caia ainda mais lentamente neste ano.
No ano passado, a taxa brasileira ficou em 20,9%, uma queda de 0,8 ponto percentual em relação a 2023, segundo dados do Banco Mundial, que considera pobres as pessoas que vivem com menos de US$ 6,85 ao dia (em paridade de poder de compra, medida usada em comparações internacionais, por refletir melhor o custo de vida dos países).
O resultado é o segundo melhor da histórica do Banco Mundial (iniciada em 1981), só atrás de 2020, quando a taxa ficou em 18,7%, em um desempenho impulsionado pelo Auxílio Brasil, programa criado pelo Governo Federal para ajudar as pessoas na pandemia. No ano seguinte, com o alcance menor do programa, a taxa voltou a subir para 28,4%, a pior desde 2011. De lá para cá, o índice vem em queda.
A taxa de 2024 só não foi menor porque a inflação tirou poder de compra dos brasileiros, segundo o organismo multilateral. Os preços subiram 4,8% no ano passado, e os alimentos (que têm peso maior no orçamento dos mais pobres) subiram ainda mais: 7,7%.
O ganho real (acima da inflação) de 2% do salário mínimo foi uma força na direção contrária e colaborou para a queda da pobreza no país.
Apesar do recuo pelo terceiro ano seguido e de a taxa ser menos da metade da que era no início do século (48% em 2001), ela ainda é muito superior a de vários países sul-americanos. Para ter uma comparação, a taxa de pobreza no Paraguai é de 16,2%, na Bolívia, de 14,1%, na Argentina, de 13,3%, no Uruguai, de 6,7%, e no Chile, de 4,6%, segundo os dados mais recentes.
O Banco Mundial alerta ainda para a desigualdade brasileira, que, ainda que em queda na medição do coeficiente de Gini (de 51,6 em 2023, ante 52,9 em 2021), segue muito distante do parâmetro de “desigualdade moderada” da entidade (40). O Brasil é um poucos países no mundo em que o indicador é acima de 50.
Além disso, a desigualdade pode ser notada nas diferentes taxas de pobreza entre os Estados: de 8% em Santa Catarina para 44% no Maranhão, por exemplo. No país, um domicílio liderado por uma mulher negra tem indicador de pobreza de 34%, quase três vezes mais do que um lar que tem como chefe um homem branco: 9%.
Para 2025, o Banco Mundial projeta uma redução no nível de pobreza de 0,2 ponto percentual, para 20,7%, continuando a tendência recente de queda, mas mostrando que vai continuar perdendo força.
Um dos motivos para esse cenário, segundo o organismo, é a expectativa de expansão menor dos gastos com programas sociais, com redução nas despesas com o Bolsa Família.
“Com espaço fiscal limitado, melhorias mais amplas dependerão cada vez mais do desempenho do mercado de trabalho. Portanto, é crucial aumentar a inclusão econômica dos pobres com uma ênfase renovada em empregos, priorizando o acesso dos pobres a empregos de qualidade”, afirma o Banco Mundial.
O organismo destaca, por exemplo, que o trabalho representava 60% das rendas dos lares não pobres e 44% dos ganhos nas residências pobres. Enquanto a taxa de desemprego dos pobres era de 26%, ela ficou em 5% entre os não pobres. Já a informalidade (que costuma pagar menos e traz menos estabilidade) ficou 68% entre os pobres e 36% entre os não pobres.
Para o Banco Mundial, o acesso dos mais pobres a empregos de melhor qualidade pode ser ajudado pela modernização dos serviços de intermediação de mão de obra, melhorando a eficácia em serviços de busca de postos de trabalho, ao mesmo tempo em que ocorre a requalificação de trabalhadores e a promoção de o investimento em setores-chave com potencial para a criação de empregos de alta qualidade.
com Valor